29 de novembro de 2006
onde amar?
foto de Steffen Foerster
aonde estás não sabes da doença patética de amar a solo
nem tens tu de saber.
nem quero eu que saibas. nunca. nunca!
se sou eu que me contorço para viver assim e assim me imolo!
fica em paz meu amigo meu desconhecido meu irmão!
fica em paz e respira um ar sem mim.
eu continuo suspensa de uma esperança.
a de poder amar sem perturbar ninguém.
com a simplicidade de criança que ama
e mesmo sem saber articular
tem esperança de que, um dia, alguém retribua aquele
amar.
26 de novembro de 2006
Homens façam-se ao Mar.
ser português é ter o mar à mão e ter a história toda dentro ao mar.
as coragens os medos os degredos as mulheres uma a uma a enviuvar
ser português é ser feitor de sonhos daqueles que se podem realizar
ser português não é pegar num búzio e contentar-se com o que lhe ouve contar
ah a vontade de empurrar o meu povo para um renovado e duro navegar!
calem-se as bocas de lamentos ocos. não deixem às mulheres só, a função de lutar
homens que se deixaram adormecer ao som dos remos
homens depilados musculados em ginásios
deixem-se de carpir iguais a velhas loucas
façam-se ao vosso Mar!
façam-se ao vosso Mar!
23 de novembro de 2006
memória
olhando da janela parece ser lá fora a realidade
mas foi cá dentro que se fez a história
que impregnou tudo de uma extensa intensa
memória de intransponível e insistente verdade.
"raios partam a memória!" li um dia
já nem sequer sei onde nem por quem
mas posso eu praguejar contra o que me sustém
de pé e a arder em quereres em vez de quieta e fria
fixando um além que não é meu porque nunca o vivi?
vive-se de memória? não sei. sei de que vivo agora
e desde sempre a sempre
cá dentro ou lá fora, meu amor
é de ti.
21 de novembro de 2006
eu sou?
por mais que me esbata
me misture à paisagem
me confine
me dispa deste ser que não sou
e que me oprime
não consigo apagar-me de uma vez.
há palavras
como a palavra eu
que carregam consigo
um peso insuportável
se não sei ser quem sou
que há neste meu viver de memorável?
esbato-me
apago-me
vou
e no entanto ainda digo
eu sou.
19 de novembro de 2006
tempestade no corpo
tal me dei à tempestade do teu corpo
dou-me hoje à natureza para que me leve a ti
mas há um sabor a recusa nos ventos
mudam de rumo. dobram árvores irreais
persiste-me a vontade de seguir-te
corro eu atrás do vento e ele a esquivar-se
oiço a voz do trovão troar de perto
- segue o teu rumo. o tempo não chegou.
deixo cair os braços. não quero. desespero.
soa o silêncio na água do meu rosto
e vem a chuva molhar-me o manto negro
e surge o sol a obrigar-me a viver.
e surge o sol a obrigar-me a viver.
e meu amor assim terá de ser.
foto de przypadek
18 de novembro de 2006
16 de novembro de 2006
menino iraquiano
corre menino direito todo à luz
foge de quem persegue de quem mata
não vão eles achar que te pareces
com filhote de índio ou de bufalo mesmo.
essa gente que está na tua terra
não tem espécie. atira estrelas
de metralhadora e mata a esmo
tu é que tens direito ao horizonte
às cores desse deserto que é tão teu
e ao som daquele pássaro que parou
no oásis. olhou. cantou. bebeu
menino do Iraque. foge corre.
para regressares e para poderes crescer
livremente entre a terra e esse
encarnado céu.
a liberdade é o que conquistares
nunca o que alguém em teu nome roubou
e a seguir deu.
14 de novembro de 2006
tira-me do escuro
só tu podes.
só tu tens mãos de luz e eu tenho medo
medo de me perder. de me esquecer
de como era a vida quando te tinha perto
ainda que incerto
vem. acende a luz
e a seguir:
não voltes a fugir.
vem. meu amor.
sabes, o mundo sem ti não fica escuro apenas
fica mau. fica muito pior. e dói.
e a dor, quando é demais
corrói.
Foto: TN Cameron
13 de novembro de 2006
aos sonhos petrificados que nome se lhes dá?
- cristais de sonho, como há cristais de rocha?
ao amor gelado que se pode chamar?
- sol- iceberg. semi-frio de afectos?
às mãos vazias. mortas de acarinhar, o que lhes chamo?
não sei. não sou poeta.
se o fosse gritaria um não ecoante. soltaria um urro sibilante.
daria conta a todos do meu vazio de amor.
felizes os poetas - fazem arte da dor!
foto: Mouser
- cristais de sonho, como há cristais de rocha?
ao amor gelado que se pode chamar?
- sol- iceberg. semi-frio de afectos?
às mãos vazias. mortas de acarinhar, o que lhes chamo?
não sei. não sou poeta.
se o fosse gritaria um não ecoante. soltaria um urro sibilante.
daria conta a todos do meu vazio de amor.
felizes os poetas - fazem arte da dor!
foto: Mouser
12 de novembro de 2006
dói-me o mundo
de frente.
pudesse eu fechar os olhos e não ver
pudesse eu ter a sorte dos meninos
que riem a correr
mas a mim
dói-me o mundo
bem na frente
e os deuses modernos
já não deixam o milagre
acontecer.
Foto: Artur K.
11 de novembro de 2006
das tuas mãos brotavam flores
ao saciar-me o corpo
das tuas mãos a chama
tu o fogo perfeito.
depois o fim
com todo o teu respeito.
mas por uma vez só
disse eu que o queria?
Foto: Rego
Foto: Rego
viva. aqui.
à tua espera e mais da morte.
nada pode parar. nem um instante.
ao sol vivo
e vou morrer. em ti.
foto: Detlef Klahm