17 de março de 2007

fado


Christine P. Newman


quem me fadou esqueceu as palavras certeiras para a sorte

deu-me voz para cantar e eu cantei. de ouvido o que eu ouvia


de instinto tudo aquilo que ao ver sabia que sentia


cantei tantas palavras de vida face à morte!



quem me fadou esqueceu-se do amor que é preciso receber


logo ao abrir os olhos no acto respirável de nascer


aprendi o amor em poema e colo aberto mas alheio


num mundo a descoberto de bom senso - enlouqueci


(mais fácil era assim esquecer. mas nem louca esqueci...)



ah, quem me fadou lembrou pelo menos a palavra exacta para a raiva!

que foi crescendo em mim como um trepadeira envolvente


até conseguir - qual génio - soltar-me da garrafa rolhada com pressão


e gritar-vos a todos:


corruptos ou irmã, Lisboa ou Moura adormecida com a Salúquia na mente


- o raio vos parta a todos! louca ou não, eu fui fadada gente!



13 de março de 2007

Rodney

sei nós.

nós de prender.

nós de agarrar

me!

de atar-me de pés e mãos

a não correr por aí

a não ouvir

a não ver

a não sentir

a não querer

(que o sonhar já eu perdi.)

sei nós

envolvo-me neles

entranço-me

enrosco enleio

os meus nós

são o meu freio

e com eles lido bem

não incomodo ninguém!

sei nós

e ato-me a mim

- o único ser que sei

neste mundo aonde vim.


10 de março de 2007

febres e outro verbo

Too tall?

madalena pestana

a febre a febre natural de quando se é gente e se adoece

essa febre.

fez-me subir a mim. não só ao mercúrio do termómetro.

o meu ainda é desses . gosto assim.

não lhe dei atenção

nasci doente de mãe e acostumei-me ao estado

mas devia ter dado. desta vez.

fui subindo. cresci em sentimentos e emoções, quase alegrias.

delírios, claro.

quando estou saudável não me deixo enganar nos sentires

não há tempo.

imaginem: no delírio, no meio do delírio dei em acreditar

e logo em gente!


quando a febre baixou. e levou tempo! magoei-me no tombo

lá de cima

daquele verbo que eu já tinha esquecido e a febre devolveu

à minha vida preparada para a morte e nada mais.


hoje fragilizada pelas drogas e pelos factos reais

consigo rir de tudo


-valham-me os deuses que há!

será que nunca mais acaba o entrudo por cá? -


escrito isto de rajada só para o registar

volto para a cama.

na segunda feira volto ao trabalho com a verdade à tona

e felizmente

já com um cromo novo para trocar!


3 de março de 2007

o verbo erguer(se)

B Berenika


ergo-me. faço por isso.

acima de todas as razões e todas as verdades

das mentiras também

as pequenas (irritantes) mentiras como os roubos pequenos

ergo-me

agora sim. iço-me a pulso até não poder já tocar o chão

olho

parece que perdi gente. de caminho. no subir.

ergo-me

ainda mais. para mais longe. mais acima. mais fora.

caem-me os braços

o cansaço saiu deles e deixou-os pendidos

sem ocupação.

ergo-me mais ainda num esforço último. desmesurado!


agora perdi tudo

agora sim - já não oiço ninguém e nada vejo

não sofro porque ao não ver e ouvir, não sinto nem desejo


ergui-me.

- consegui toda a paz que cabe num bocejo


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