30 de janeiro de 2007
pausa
partida suave
29 de janeiro de 2007
engano
no rir de criança na música ouvida
nos passos na dança nos volteios dados
nos murmúrios bons de rios distantes
renovando em mim a infância esquecida
tão sem compromisso o acerto no passo
não te disse amo não chamaste querida
28 de janeiro de 2007
limpar o pó ou escrever?

é assim desde sempre. não chegou com a idade. tive memórias longas já na infância. essas ainda eu podia regar com a chuva e espalhar pelos trigais. de onde vinham? sei lá. eu não sei nada.
mas saber escrever então, ainda menos que nada. deixo cair palavras. talvez por sorte, algumas caiem no lugar que alguém acha ser certo. não fui eu. foi seguramente uma corrente de ar no pensamento que para ali as atirou.
foto : madalena pestana
como podia eu vivendo em rua estreita, cercada a muros e noites de automóveis, aprender a escrever digam-me lá?
- se fosse génio...
pois. se fosse...
mas não sou. não fui. nunca serei. só conheci três génios - o mau o bom e o da lâmpada de aladino (até esse de lenda).
mas conheço escritores e reconheço-os. daí dizer claramente enraivecidamente: eu não sou!
mas porquê isto tudo? porque não sei escrever. está frio. não me apetece ler e muito menos ir limpar o pó.
26 de janeiro de 2007
trança
no meu
tanto o frio!
um corpo de mulher
fica dormente
como folha vegetal
fica na noite.
entrança os ramos
do teu corpo
em mim
pelo menos até
que passe o inverno.
o teu corpo no meu
em trança
os corpos
24 de janeiro de 2007
sabores
23 de janeiro de 2007
vida morte e companhia
casca envelhecida. o tronco já cede. nada do que vejo me parece igual.
há desilusões nos cantos dos lábios. descidos descrentes. apontando o chão.
como árvore velha conheço os caminhos mas não os percorro. contento-me em ver.
pudesse eu ainda arrancar raízes. sair de onde estou. mirar rotas outras.
mas eu já não posso. como árvore estou presa. como gente sei que nada mudava.
fosse eu onde fosse a vida era igual. sem coragens novas. rasgos de loucura.
sem fadas nos bosques ou tímido amante com cândidos gestos. dos de encorajar.
chega o fim da estrada e eu chego ainda antes. é assim a vida . é assim a morte.
pelo meio encontrei boa companhia. companhia errada. e tanta perdi!
quedo-me sentada. ante o fim da estrada. não choro. não rio. não lamento nada do que já vivi.
20 de janeiro de 2007
des-faço Amor

arranco a palavra do meio das pedras
rasgo dedos mãos. as unhas partidas
pego-lhe por fim.
lavo-a de poeiras passadas
trazidas pelo vento pelo tempo. por outros
que a usaram à sua maneira
burilo-a. trabalho-a. afago-a. aqueço-a
deixo o mesmo nome
para quê mudar? é o nome que sinto
se sinto a palavra
com cuidados todos feitos de cristal
passo-a para tinta
escrevo-a mil vezes
e num gesto lento. quase ritual
desfaço o papel.
17 de janeiro de 2007
cerca quebrada ao vento
1ª ilustração
METAMORFOSE (73)
Passa livremente.
Liberto vento.
Leva as novas em porfia.
Sei que não é a carta a Garcia.
Mas repara.
Eu, sou cerca quebrada.
Para te facilitar.
Na tua ágil caminhada.
Onde os arbustos vergados.
Te indicam.
O encurtado rumo. A rota breve.
Aches a satisfação plena.
Aquando da missiva entregue.
Divisares a felicidade da Madalena.
poetaeusou(comentando)
2ª
Teresa Durães said...
hoje sou transparente
deixo um beijo apenas
3ª
bettips said...
Não quebrada, não caída. Apenas mais velha, aguardando os pregos da esperança e o oiro da seara.
4ª
as velas ardem ate ao fim said...
hoje sou apenas eu..
a ver mais longe...
5ª
caeser said...
Senhora!
por onde começo a enrolar o arame?
.
.
.
e se arrancasse as estacas e deixasse os passos livres ao sabor da ventania?
.
.
fala.me em cercania?
.
afinal ,que diz vossa senhoria?
( posso? )
eu sabia!!!!!!!!!!
6ª
dulce said...
... ou cerca aberta ao vento ! Que prazer abrir os braços e senti-lo a passar através de nós!
7ª
Yukio disse...
Quando o Amor aperta até se vai voando e, se não for o corpo fisico,vai a alma ..até onde puder chegar
Uma cerca é muito pouco para um grande Amor
8ª
Um outro olhar disse...
e por onde passares decerto um olhar roubarás
16 de janeiro de 2007
hoje não escrevo, Amor.
não lhe sei o sentir. conheço a palavra como tantas que tenho na memória. nada mais.
decorei-a nos bancos da escola em poemas vazios. não vividos por mim. quero lá saber de amar!
só falo do que sei. hoje, quem se sentir amado que me conte como é. tem paladar? textura? odor? o que é isso afinal?
esvaziei-me na espera. não se espantem. a vida é mesmo assim. um poço onde se cai muitas vezes de tão oco nos surgir o acto de viver.
hoje caí no poço. nada me erguerá. muito menos a escrita. muito menos o amor que não me dão. muito menos...
- muito menos o quê?
mas de que estou eu para aqui a falar? de nada claro. de que posso falar se não sei se não penso e se não escrevo amor?
uma mão no meu rosto... a tua? - não não é. imaginei apenas.
o melhor é fechar os olhos e dormir. dormir muito. dormir para lá do tempo. do verde. do azul.
quem sabe se a sonhar sei que me amas?
amar. o que é amar?
15 de janeiro de 2007
14 de janeiro de 2007
que louca que sou!
só que desta vez quem falou foi ela. falou-me de povo. falou de nós gente. tristeza na voz de velhice quente.
diz-lhes que se acalmem. não corram demais. preparem as almas dos corpos doentes. dos corpos das mentes nada lhes virá que os possa salvar. misturem-se à terra. partilhem-lhe o ar.
e não falou mais. voltei lá. é claro. mas nem a folhagem caída - é inverno - podia acenar.
sobre o que eu ouvi parei para pensar.
não. ainda não. não enlouqueci. se quiserem pensem naquilo que ouvi.
*
o meu tempo voa. pouco falta já. se isto é já loucura, tanto se me dá.
13 de janeiro de 2007
são penas
era linda a ave
entrou no meu espaço
não quis segurá-la
garanto. não quis.
ela estonteou
presa entre paredes
foi soltando penas
para se libertar
eu fui-as guardando
(tão bom é amar...)
11 de janeiro de 2007
pausa.
o rio corria ali. tumultuoso. do outro lado dos meus braços esguios e cansados. ali. na minha frente. e tinha sede.
baixei com esforço as mãos. em concha as ergui com pouca água. muita foi derramada no percurso de a levar ao rosto ressequido por ventos e passados.
a que sobrou devolvi-a ao rio. não desperdiço água. ou acumulo.
o rio seguiu na queda até à margem. a ajustar-se no solo. acomodado. acalmado do roubo que lhe fiz.
uma gota ficou-me presa à pele. eu sei. a água é dele. mas foi só sede e pó que a retiveram.
não fui bem eu que a quis...
iguais

lágrimas são rastos de sinais
antigas como o tempo
usam-se às vezes à laia de lamento
outras são meros sais a-mais
nos olhos secos
lágrimas são infértil água
inundando as palavras
desfeando rostos por desgostos
com sulcos irreais
as minhas lágrimas
são iguais às demais.
10 de janeiro de 2007
extensão
estendes-me a voz
num murmúrio cadente musical
estendes-me a arte
abraço de gigante a saciar-me a mente
estendes-me sonhos
da distância tão vasta mas presente
será suficiente?
talvez...
estendes-me a mão?
9 de janeiro de 2007
perdi-me. de mim?
parti de mansinho mal tinha tamanho só queria fugir.
não levei comigo nem história nem vida nem sequer farnel
já tinha cansado de correr falésias à beira da morte
quis-me mais crescida quis-me mais vivida quis-me de outro jeito
havia uma casa na estrada comprida mas não quis ficar
pouco o que pedia só queria encontrar em cena um papel
que me destinassem que fosse só meu que agarrasse ao peito
a estrada era grande e eu já me cansava mas há que seguir!
dizia a mim própria para me acalentar procurando um norte
usava a tristeza que me assoberbava o corpo ainda escasso
como companhia na estrada irreal que ainda hoje percorro
caminho caminho sem nada saber e pouco encontrar
sei que me perdi. em que encruzilhada? não posso parar! morro de cansaço...
encontrar-me a mim era sem saber o único intento
encontrei os campos encontrei os outros e amores e venenos
descobri beleza rejeitei riqueza disso me sustento
bebo água nas fontes saltito nos montes - prazeres bem pequenos
perdi-me das gentes perdi-me da fama perdi a vontade
de ser mais vivida de ser mais crescida só quero ser verdade.
8 de janeiro de 2007
a cama

deitada só. num canto. no canto mais afastado do meu lado da cama. sinto o cheiro do leito desarrumado onde estiveste. estivemos.
estivemos ou sonhei? não faz diferença. vivo um tempo onde pouco se distingue já a realidade, da vida tranformada meio ao sono.
tinhas entrado de rompante nessa noite. não vinhas para ficar e eu sabia. sorriste. sorri-te. não conversámos muito. estavas meio acanhado, à laia de criança travessa antes de disparar a nova traquinice. eu tremia de qualquer coisa que sabia a esperança mas não devia ser. esqueci-lhe o pulsar há muito tempo.
a cama estava lá. envelhecera como eu. na espera ou na ausência de calor.
a cama sabia histórias vazias já de arroubos de prazer. mas estava lá. a cama.
falei-te de lugares antigos. paladares. raízes. ervas de aroma inimitável. rias. crescia-te no cabelo o cheiro dos gostos que eu lembrava. o meu corpo acordou.
- tira os óculos.
- não vejo.
- antes assim...
eu tímida de novo. cicatrizes de partos que não queria mostrar.
beijei-te os olhos.
a cama. a cama esperava. pouco arrumada. fria. como agora.
*
vi-te sair a porta. não doeu. na minha idade a dor é relativa. vem. instala-se. acomoda-se. a gente vai-se habituando a ela e passa a fazer parte da espera.
como a cama. agora.
6 de janeiro de 2007
cor de rosa
a rosa de cristal era de vida verdadeira
sangrava gelo de distância. de onde estava
poisada. gotejava isolamento na paisagem
a rosa de cristal era demasiado vidro
para sentir. parecia que fingia sentimento
vivia de silêncios e de frio com gumes
de água cristalizada. a brilhar. a brilhar
mas sem poder iluminar o dia.
vez em quando a um estranho raio
de sol. que mal se via. de tão filtrado
pelas nuvens cerradas em redor
a rosa de cristal ganhava sentir. cor.
4 de janeiro de 2007
e que esfriou
3 de janeiro de 2007
voo alto
disparo-me de encontro ao impossível
vou para lá de tudo o que é credível
e até a mim reinvento ao acertar
corto males pela raíz vejo futuros
atravesso terras rios muros
e cravo-me no incerto lugar
onde me esperas sem me saberes
sequer.